Anderson Silva: Como Água
(Like Water),
de Pablo Croce (EUA, 2011)
por Pedro Henrique Ferreira
Golpe
bem dado
No princípio de Anderson Silva: Como Água,
imagens de arquivo de Bruce Lee revelam os rumos para o qual o
diretor norte-americano Pablo Croce leva sua obra: gigante do
UFC é ligado a um mestre das artes marciais como se para
demonstrar a afinidade técnica e filosófica entre
ambos. O mito Anderson Silva seria um lutador paciente e imperturbável
que trabalha silenciosamente, com rigor, até a exaustão.
Aos poucos, revela-se que esta paciência
é também uma resistência, uma capacidade de
suportar os golpes, seguindo numa linha de discurso a la
Rocky Balboa onde o mais forte não é o
que bate, mas o que agüenta apanhar mais.
O
monstro da luta-livre é contraposto a Sonnen, que lhe ridiculariza
e lhe golpeia sequencialmente, tanto publicamente, criando intrigas,
quanto no ringue, com repetidos socos. Comparado ao parlapatão,
Anderson Silva seria um túmulo que simplesmente agüenta
o tranco. Todo
o encanto de Anderson Silva: Como Água vem proporcionalmente
ao encanto que o documentarista tem por seu personagem, permitindo
que, em alguns momentos, ele perverta esta lógica mais
rasteira e crie ótimas situações. Em algumas
entrevistas, em vez do silêncio, o lutador prefere ironizar
o rival. No treinamento, ao invés de exercícios
regrados, abre-se espaço para momentos de trivialidades,
brincadeiras e preguiça. Contrariando sua determinação
de se agüentar os golpes, por vezes reclama, rabugento, que
seus adversários são fortes demais.
Mas, em um instante milagroso no último round de uma luta aparentemente perdida, Anderson Silva dá uma chave e reverte a situação. O resultado é que não se trata tanto do discurso batido sobre quão importante é agüentar os trancos da vida, quanto de um outro que Anderson Silva formula secretamente, e que Pablo Croce permite emergir: que para vencer, é inútil se bater o tempo todo, e mais efetivo um único golpe bem dado no momento correto.
Outubro de 2011
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