Faça-me Feliz (Fais-moi plaisir!),
de Emmanuel
Mouret (França, 2009) por Filipe Furtado
Brincando
com os elementos de cena
Emmanuel Mouret pode
não ser Otar Iosseliani, mas nos últimos anos vem se esforçando em manter viva
a influência de Jacques Tati na comédia francesa. Não se trata propriamente de
um renovador, mas Faça-me Feliz é um filme muito mais interessante que
a média das comédias francesas que chegaram aos nossos cinemas nos últimos, sem
com isso deixar de ser um filme assumidamente popular. O
filme tem um fiapo de argumento – rapaz é obrigado pela namorada a se encontrar
com uma mulher com que ele flertara dias antes, após confessar o que acontecera
– que é usado por Mouret para construir uma série de
gags formalistas geralmente construídas sobre objetos e relações de espaço
(Mouret tem uma queda pelos mais absurdos cenários). A ação principal transcorre
numa festa inspirada em Um Convidado Bem Trapalhão, de Blake Edwards, mas
com uma tradição de comédia francesa substituindo o pastelão mudo que Edwards
buscava retomar. Se algo o diferencia de Tati e Edwards é que Mouret tem certo
prazer masoquista com as humilhações que impõe ao seu personagem, e o filme por
vezes sugere uma elaborada punição a um homem que fora infiel em pensamento (com
seu humor surgindo também do desarranjo entre o crime e seu castigo). E ainda
que o Mouret-comediante não ancore o filme com a mesma força que um Peter Sellers
ou um Tati, ainda assim há muitas soluções ótimas para garantir o crescente humor
absurdo do filme. Não
há objeto de cena que, nas mãos de Mouret, não possa ganhar vida para se tornar
co-protagonista das seqüências e o cineasta tem bom domínio de timing para garantir
a escalada do absurdo das situações. Há sobretudo uma paixão pelas possibilidades
do casamento entre humor físico e formalista, que nos envolve sempre. Mouret é
como um adolescente a se divertir com todas as possibilidades que seu set de filmagens
lhe libera e é sempre prazeroso lhe acompanhar na sua jornada. Ocasionalmente
o filme ameaça perder um pouco de gás (especialmente ao fim do longo primeiro
ato com a namorada e depois ao fim da festa), mas Mouret sempre encontra algum
elemento de cena para devolver o filme ao seu curso. A irregularidade do filme
é conseqüência direta de uma crença encantadora no peso de pequenos momentos individuais
responsáveis por muito da sua graça. Outubro de
2009 editoria@revistacinetica.com.br
|