in loco - cobertura dos festivais

O Bom, O Mau, O Bizarro
(Joheunnom Nabbeunnom Isanghannom),
de Kim Ji-woon (Coréia do Sul, 2008)
por Ronaldo Passarinho

Nada pessoal

Difícil não simpatizar com um filme cujo diretor tem a cara-de-pau de usar Don’t Let Me Be Misunderstood na trilha sonora depois do sucesso dos anos 70 do grupo Santa Esmeralda ter sido (muito bem) usado, por Quentin Tarantino em Kill Bill. Mas, faz sentido: o faroeste kimchi de Kim Ji-woon deixa claro, já no título, seu débito com o faroeste spaghetti Três Homens em Conflito (Il Buono, il Brutto, Il Cattivo), de 1966, dirigido por Sergio Leone, um dos cineastas mais citados nas duas partes de Kill Bill (até mesmo literalmente nos créditos finais da segunda). Pode-se dizer que, ao citar Tarantino, Kim faz um pastiche do pastiche. Na verdade, um pastiche do pastiche do pastiche, já que a obra-prima de Leone não deixa de ser um pastiche de filmes de faroeste hollywoodianos.

Nem Leone nem Tarantino nem Kim tratam o pastiche como imitação servil ou paródia. Não escondem suas fontes nem se apropriam de estilos anteriores para zombar desses estilos. Mas Leone e Tarantino precisavam se apropriar desses estilos para se sentirem à vontade dirigindo um faroeste na Itália ou um filme de artes marciais nos Estados Unidos. Eles sabiam, e sabiam que sua audiência sabia, que não estavam sendo originais em suas escolhas (ou ainda, questionavam o que ainda significaria “ser original” no cinema). O pastiche, nesse caso, não é um fim em si mesmo, é um modo respeitoso de dialogar com o público.

Infelizmente, o pastiche em O Bom, o Mau, o Bizarro, parece não resultar da ânsia que o cineasta tem de se expressar em estilos que já não podem ser inocentemente imitados. É a citação pela citação. Depois de intermináveis cenas de perseguição, tiros e explosões, burocraticamente dirigidas, mas energicamente montadas, os três personagens principais se confrontam num inevitável duelo à trois. A cena mais emblemática de Três Homens em Conflito, filme que Tarantino considera o “mais bem dirigido de todos os tempos”, está prestes a ser reproduzida. E o que Kim nos dá? Imitações dos closes dos filmes de Leone, com os personagens que se entreolham, uma série canhestra de fusões de rostos e muitos tiros em câmera lenta. Nada pessoal. É a padronização do pastiche – só que como perfumaria.

Setembro de 2008

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