in loco - cobertura dos festivais

Import Export (Import/Export),
de Ulrich Seidl
(Áustria, 2007)
por Ronaldo Passarinho

Toda miséria será explorada

Uma moça ucraniana vai para a Áustria em busca de trabalho. Um rapaz austríaco, fazendo bico com seu padastro, vai para o leste europeu. Durante mais de duas horas, Ulrich Seidl se contenta em mostrar os dois jovens lutando para conseguir, e sofrendo toda sorte de indignidades para manter, uma vasta gama de subempregos. Ela vai de stripper de webcam à faxineira de asilo; ele, de guarda de segurança a aspirante de carregador de caminhões.

Seus caminhos nunca se cruzam. Tanto o jovem “exportado” para o leste europeu quanto a jovem “importada” de lá não conseguem encontrar um emprego na Áustria que lhes dê alguma dignidade. Nem os pacientes do asilo onde ela trabalha recebem um tratamento digno – seja por parte da sociedade, seja principalmente por parte do cineasta. E é aí que reside o grande problema do cinema de Seidl e de outros que seguem a mesma linha: uma coisa é retratar o mundo cão por contestação ou por simples constatação, outra é retratá-lo por apelação.

Em uma cena desnecessariamente longa (de um filme desnecessariamente longo), Seidl encena a humilhação de uma prostituta ucraniana de 19 anos pelo padastro do rapaz austríaco – criando um paralelo com a trajetória da moça que trabalhou como stripper. Ele manda que ela repita em alemão, sem entender o significado do que diz, que ela é uma cadela. Não satisfeito, ele a leva para passear de quatro pelo quarto e a obriga a latir. Um homem nascido em um país rico, a Áustria, terra natal do cineasta, usa e abusa de uma garota de um país pobre do leste europeu. A alegoria socioeconômica é clara. Precisava ser tão redundante?

Para Seidl, precisava, pois é de redundâncias e repetições gratuitas de cenas patéticas ou degradantes que é feito o seu cinema. Não basta para o cineasta mostrar uma velha à beira da morte agindo como criança e pedindo para ver sua mãe. Ele “precisa” repetir a cena mais de uma vez, até que perca toda a força que poderia ter tido em algum momento. E, assim, a exploração da miséria e da dor vira um fim em si mesma.

Outubro de 2007

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