O
Olhar Invisível (La Mirada Invisible),
de Diego Lerman (Argentina/Espanha/França, 2010)
por Eduardo Valente
Cinema
de resultados
Logo na primeira sequência de O Olhar Invisível,
que pode sem medo ser chamada de “sequência de introdução”, Diego
Lerman deixa absolutamente evidente o seu domínio da linguagem
cinematográfica. Ali, ele consegue, em poucos minutos, reproduzir
todo o clima de paranóia e repressão vivido pela Argentina no
1982 em que se passa o filme, simplesmente filmando um grupo de
alunos colocados em fila por uma inspetora de colégio e levados
até a sala de aula para a chamada. Ali ele também demonstra a
inteligência de quem sabe que seu filme se constrói nos olhos
de seus personagens (o título, claro, já indica isso), e usa muito
bem sua admirável atriz principal, Julieta Zyberberg para isso.
O fato dela ter sido uma das protagonistas de Menina Santa
certamente não atrapalha a que pensemos em Lucrecia Martel como
uma referência forte para o filme, pela maneira como a relação
do corpo dos personagens com o mundo será determinante ao longo
de toda a projeção. No entanto, é exatamente
este domínio preciso que acaba sendo o calcanhar de Aquiles do
filme: sempre preciso, controlado. Retomando a lembrança de Martel,
é um pouco como se um filme desta fosse dirigido por Juan José
Campanella. Uma estranha combinação.
Lerman
realiza um filme que “faz sentido” o tempo todo, consegue levantar
todos os símbolos e metáforas que deseja, mas que nos toca muito
pouco – exatamente porque, desde essa primeira sequência, entendemos
exatamente onde ele quer chegar. Falamos em metáfora, porque é
bem claro que as duas personagens principais do filme (a inspetora,
e a escola em si) funcionam como metonímias da Argentina do período
(tanto que, depois de resumir o filme o tempo todo ao interior
da escola e da casa da personagem – com pequenas exceções todas
elas filmadas de forma absolutamente fechada – Lerman nos créditos
finais faz questão de trazer imagens de TV da época, com manifestações
nas ruas). São personagens cheios de significados, que não podem
fugir, portanto, do destino que a elas está traçado desde o começo.
Trata-se de uma estrutura que não precisa ser
um problema em si, mas a questão é que Lerman não consegue fazer
com que seu roteiro incuta nesta simetria e na narrativa nada
que não faça com que o filme gire em círculos durante boa parte
de sua duração, esperando apenas pelo símbolo final e definitivo,
que vem na sequência catártica de rigor (mortis, no caso). Mas,
que não haja engano: é um filme que fará sucesso no circuito dos
festivais (talvez além dele), pois Lerman não deixa nada a dever
para muitos dos grandes autores do cinema atual – com toda a dubiedade
que o elogio pode carregar.
Maio de 2010
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