in loco - cobertura dos festivas

Nova York, Eu Te Amo (New York, I Love You),
de Mira Nair, Fatih Akin, Yvan Attal, Allen Hughes, Shekhar Kapur, Shunji Iwai, Joshua Marston, Natalie Portman, Brett Ratner, Wen Jiang, Randall Balsmeyer (EUA/França, 2009)
por Julio Bezerra

Frágil coerência

Emmanuel Benbihy está de volta. O produtor transnacional por trás de Paris, Eu Te Amo reafirma sua franquia dessa vez com um filme sobre Nova York. Este, no entanto, apresenta de cara uma lista ao menos estranha de diretores (poucos nova-iorquinos de fato, alguns estreantes e nenhum cineasta realmente de ponta – com a exceção talvez do turco Fatih Akin). Qual a lógica curatorial desses convites? Por que esses realizadores e não outros? O que se percebe é uma tentativa de uniformização estética e narrativa. Nova York, Eu Te Amo almeja uma certa coerência interna. Mas a pergunta é: basta juntar uma história com outras em situações em que seus respectivos personagens se chocam tendo uma mesma cidade como ambientação? Vejam só: um malandro batedor de carteiras que acaba aprendendo uma lição de um professor mais velho. Uma judia às vésperas de seu casamento que conta a sua história para um indiano cuja esposa fugiu pra uma nova vida espiritual. Um jovem compositor de trilhas sonoras que é estimulado a conhecer Dostoievski e se apaixona pela voz de sua secretária. Um formando que descobre a paixão ao lado de um jovem em cadeira de rodas. Uma veterana cantora de ópera que parece atormentada pela perda. Um pintor obcecado por uma jovem oriental. Um casal de simpáticos velhinhos. O que une esses personagens? Nova York? Não me parece.

Ao contrário de Paris, Eu te Amo, em que a capital francesa parecia ser o que justificava a união entre episódios que não cumpriam necessariamente qualquer diálogo estilístico ou narrativo, Nova York é mais coerente. Não se trata exatamente de um filme composto de curtas, como são os seus pares de franquia. Os cineastas, suas histórias e opções, não têm nenhuma autonomia. Todas as seqüências se afirmam como sacadas visuais ou verbais. Há sempre um encontro, humor e uma surpresa final. É possível identificar uma proposta estética e narrativa que costura todos os seguimentos do longa. Costura? Talvez o verbo mais adequado seja aprisiona. Pois o filme está sempre criando situações transitórias e de interação entre os personagens. Estes são obrigados a se cruzar diversas vezes entre os “curtas”.

Nova York mais parece um filme ressentido de sua própria condição, maquiando em um esforço por vezes constrangedor uma unidade que jamais se apresenta realmente. Embora seja palpável o espírito de soma e conjunto que marcam as diversas seqüências desse filme, ainda assim todas elas funcionam na verdade como pedaços autônomos. Nenhuma das seqüências precisa realmente das demais para existir. Os personagens entram em um mesmo táxi. Eles se cruzam na rua ou em um bar. São forçados a fumarem cigarros juntos. Mas esses pontos de contato não atenuam a forte impressão de que, a todo momento, um filme acaba e outro começa sem evidenciarem a razão de serem vizinhos. Ou seja: Nova York é um conceito que se desdobrou em imagens. O grande problema é a fragilidade desse conceito e este desdobrar em imagens. O que vemos é um filme que fica no meio do caminho entre a soma aleatória de imagens e uma única imagem somada no tempo. Não há nenhum equilíbrio nessa estranha equação.

Outubro de 2009

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