in loco - cobertura dos festivais
Simon Killer, de Antonio Campos (EUA/França, 2012)
por Filipe Furtado
Estudo
de caso
Antonio Campos recebeu muita atenção pelo seu
longa de estréia, Afterschool. No entanto, para
um filme cujo tema era tão claramente a juventude americana,
era chocante o quanto isto surgia no filme pela via do abstrato,
tamanho o desinteresse que o diretor demonstrava pelas figuras
que atravessavam seus planos. Pois bem, quatro anos depois Campos
está de volta com outro olhar sobre um jovem americano
(ainda que bem mais velho que os estudantes de Afterschool),
e sua abordagem não poderia ser, a principio, mais distante.
Basta dizer que o roteiro de Simon Killer é assinado
por Campos e seus dois atores centrais. Simon Killer
buscará junto a seus dois atores uma intensidade de intimidade
a cada cena, enquanto mostra duas identidades ruindo aos poucos,
cada uma à sua maneira, em meio a jogos de poder e mentiras
compulsivas. Como Simon, Brad Corbet é sempre uma coleção
de nervos, ótimo como uma bomba relógio: seus tiques
justificam a sugestão de gênero do título
e criam o retrato de um psicopata em potencial (Mati Diop tem
menos a fazer na posição de figura de abuso).
Boa parte do primeiro ato do filme se resume a seguir Simon enquanto
ele perambula por Paris: solitário, iPod nos ouvidos, tateando
uma possível conexão com os locais. Estas são
imagens muito decalcadas do cinema de Sofia Coppola, um mergulho
subjetivo com pouca relação com a secura do filme
anterior. Porém, como seu titulo sugere, Simon Killer
não pode se concentrar só neste cinema de deambulação:
há um elemento sinistro presente ali, a impressão
constante de que há algo errado com este tímido
jovem americano a curtir uma fossa amorosa em Paris. Há
uma tensão constante em Simon Killer, efeito de
um pacto com o espectador, que reconhece a cada plano o potencial
de desastre físico e emocional. Cada novo plano nos chega
duro e pesado pela certeza de que não será possível
sair do filme impunemente.
Simon conhece uma prostituta local (Diop) e Campos salta de registro
novamente para relatar a história de uma psicose. Campos
decide que seu filme pede por uma aparência largada, que
a intimidade daquela relação só pode ser
representada sobre uma superfície sem foco. Mas tudo isso
vai contra seus instintos. Simon Killer é tão
controlado, à sua maneira, quanto Afterschool
já era. O cineasta só empresta um estilo diferente
para o material, mas o mantém sobre rédeas curtas,
sem lhe permitir qualquer momento solto genuíno. Quando
Simon escapa da prisão da relação e sai com
outra garota, Campos habilmente muda o registro, adota outro estilo
que lhe convém para indicar liberdade. Antonio Campos,
Simon Killer nos revela, é como um Michael Winterbottom
mais ambicioso: cada filme é só um exercício
formal diferente, em que se copia com competência diferentes
estilos que parecem se aplicar melhor, sem investir o filme de
qualquer força própria. Um academicismo de alta
arte, mas tão frouxo como qualquer outro.
O
que resta em Simon Killer é Corbet e sua psicose.
A presença de cena do ator, sempre muito física,
como um animal desgovernado, empresta ao filme um pouco de dignidade,
que seus jogos logo afundam. Como boa obra de acadêmico,
Simon Killer é um filme clinico e o espaço
que cabe para Simon é o do estudo de caso mais tacanho.
Tudo se fecha na asfixia. Assim como Afterschool, Simon
Killer existe no terreno da abstração: não
é sobre dois personagens especificos (a despeito da entrega
de Corbet e Diop), mas somente mais um caso que a câmera
de Antonio Campos vai tratar de encerrar.
Outubro de 2012
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