Bróder, de Jeferson De (Brasil, 2010)
por Paulo Santos Lima

Passos adiante

Tempo de gestação deste Bróder, cinco anos é muito tempo para concluir um filme, sobretudo no boom de “filmes sociais” que rolou nos anos 2000. Mas algo funciona bem em Bróder, história de três amigos, meio irmãos e meio primos, cada um com uma determinada relação com o meio onde foram criados – o Capão Redondo, periferia de São Paulo. Um é o típico mano, Macu (Caio Blat), e os outros, que saíram de lá, são um jogador de futebol (Jonathan Haagensen) e um formado em Direito (Silvio Guindane). Ainda que tudo pareça estruturado demais, sempre a serviço de uma ilustração social, o que o filme mostra bastante bem é o lugar. Não temos, aqui, o blablablá da boa comunidade do novo 5x Favela, mas, ao contrário, uma tensão permanente, que inclusive escoa para os momentos mais ternos dos personagens, como a dança entre Ailton Graça e Cassia Kiss, os momentos bonitos entre amigos.

É quase uma derivação, mais impactante e atraente, de De Passagem, filme de Ricardo Elias. Com uma ambientação em espaço semelhante, mas com bastante mais tensão (e drama). Essa idéia de “já feito antes” até resulta interessante, pois quebra as pernas de um diretor sempre afeito ao bafafá, à rebeldia. Neste Bróder, encontramos o mesmo Jeferson De de curtas como Distraída para a Morte ou Carolina: um cineasta que assistiu a muitos cinemas, mas não consegue reutilizar tão bem o conteúdo adquirido na realização. Seu novo filme tem algo de Quatro Irmãos, de John Singleton – não à toa, outro cineasta que foi se encaixando no sistema, nas grandes narrativas, na boa forma do modelo dramático, em contraposição ao discurso anti-sistema. O filme de Jeferson De é atento à dramaturgia, poderia bem ser um filme de Spike Lee ou do citado Singleton. Jeferson não nega o que sempre pareceu ser sua vontade: fazer um filme “de qualidade” com equipe “de qualidade” (atores conhecidos, opção pelo espetáculo na encenação). Seria um ótimo filme comercial (mas, pergunto, em que cinematografia?), mesmo que algo fique meio vaporizado.

Se Meirelles é bastante criticado (com razão) pelo final cínico de seu Cidade de Deus, no qual a voz narradora dá juízo de tudo e se coloca em local seguro, Bróder adota uma estética que tem mais a ver com a desse cinema que privilegia o momento, e que se opõe à elucidação clara dos acontecimentos (e que, entre tantos outros, vai desde os bons exemplos em Karïm Ainouz até alguns péssimos curtas-metragens). Seu plano final, e a situação em aberto pendente a ele, parecem uma solução tão conveniente quanto cínica. Caio Blat, excelente, fazendo um mano da periferia, é a imagem dessa necessidade perdida, empenada, de se trabalhar dentro de um modelo que é incerto, híbrido, que já reunia há tempos a legitimação do Cinema Novo com o popularesco da TV para, em seguida, encontrar o modelo ainda difícil para nossas possibilidades do cinema comercial industrial.

Julho de 2010

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