in loco - festival de brasília
2007 Terceiro dia: nos curtas, ovações
e vaias para a delicadeza por Cléber Eduardo
A delicadeza tem sido a característica mais celebrada
pelos aplausos nas primeiras duas noites do Festival de Brasília. E também motivo
de vaias. Os aplausos vieram antes, na primeira noite, com Espalhadas pelo
Ar, de Vera Egito. Depois, na segunda noite, com Café com Leite, de
Daniel Ribeiro. Ambos de São Paulo. Vera Egito centra seu foco em personagens
femininas – adolescentes e adulta. Daniel Ribeiro dirige sua câmera para uma relação
familiar homossexual. Café
com Leite começa com um projeto conjugal gay. Dois homens na cama, beijos
na boca, juras de amor. Silêncio na platéia lotada. Podia-se ouvir até os batimentos
cardíacos. Uma morte. Surge uma criança, irmão de um dos personagens, que muda
a dinâmica. Uma nova família, em outras bases, de aprendizado mútuo, começa a
ser construída. Tudo muito naturalizado, filmado com suavidade, com equilíbrio
na passagem de um plano para outro, eventualmente com as cenas expressando em
excesso as intenções, freqüentemente acertando o tempo e no humor, sem excessos
ou forçadas de mão em busca do riso. No
filme seguinte, Décimo Segundo, do pernambucano Leonardo Lacca, a delicadeza
está também lá, mas a platéia vaiou. O curta parece uma seqüência de um longa,
como se fôssemos jogados no meio de uma narrativa já em andamento, que não terá
também um desfecho, como se acabasse ainda no meio. Isso fere o projeto do curta
como curta? Não. Lacca segue um projeto estético de imersão nos espaços e nos
olhares, nos gestos, nos silêncios e nos constrangimentos, buscando uma dramaturgia
dos pedaços, do mínimo, do sugerido, do extracampo, nos dando parte de uma experiência,
não a explicação ou contextualização dela. Um cinema do fenômeno em si mesmo e
não de suas causas/efeitos como meta a ser cumprida. Pode-se questionar um certo
fetichismo em dados momentos, nos quais o formalismo do enquadramento parece se
sobrepor ao material humano, mas é um curta com cara de esboço e de laboratório,
que procura tatear uma forma menos conotada de expressão cinematográfica. Por
que as vaias, então? Porque o público do Festival de Brasília, mais que outros,
tem uma exigência hedonista: quer rir, quer compreender, quer se emocionar. Décimo
Segundo não se presta a nada disso. Está vinculado ao cinema moderno, não
à organização dos sentidos e dos acontecimentos. Novembro
de 2007editoria@revistacinetica.com.br
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