Dois passos para a frente, um para
trás por Cléber Eduardo e Eduardo
Valente Encaramos a crítica de cinema como uma atividade
múltipla, praticada não apenas nas teclas de nossos teclados, onde atuamos solitariamente
com nossa percepção, mas também como uma atuação olho no olho, em contato direto
com nossos leitores, abrindo-nos ao diálogo direto e a escutar "o outro lado".
Até porque, no fundo, é o mesmo lado – apenas em diferentes posições.
Por isso mesmo, comemoramos nosso primeiro aniversário com quatro aulas/palestras
realizadas no Cinesesc, em São Paulo, com a participação de mais de 40 alunos.
O curso Recortes sobre o Audiovisual Contemporâneo, cobriu quatro aspectos
do universo das imagens contemporâneas: a dinâmica histórica e contemporânea do
cinema popular brasileiro, as novas configurações da família na produção atual,
a recorrência de filmes brasileiros pautados pela rupturas de personagens com
seus espaços e o compromisso com um realismo do espetáculo nos renovados regimes
de visibilidade. A partir desta semana, ampliamos o curso para as páginas da revista,
em textos que resumem no formato mais tradicional da intervenção crítica aquilo
que foi discutido ao vivo no Sesc.
Esperamos que o curso, de fato, tenha
sido o primeiro. Nosso objetivo é estreitar distâncias, comprometidos a partir
dessa estréia com a viabilização de cursos a preços acessíveis, abrindo uma possibilidade
mais ampla dentro de um universo ainda bastante elitizado. Não se trata de operação
demagoga, mas de um esforço para não se restringir a cultura e o conhecimento
do cinema a uns tantos com a conta bancária mais tranquila, quando nossa luta
é para expandir a comunicação com as pessoas interessadas. E interesse não se
mede, nem se filtra, com preços segmentadores de um universo já segmentado – o
do estudo do cinema e do audiovisual. Estejam convidados desde já para estarem
com a gente nas próximas ações. * * * Cinética
iniciou a comemoração de seu aniversário com a primeira sessão paulistana de Conceição
- Autor Bom é Autor Morto, filme que destacamos agora com um texto crítico,
uma discussão em cartas com um de seus diretores sobre o lançamento comercial
e uma Conexão Crítica sobre a sua recepção em textos. Trata-se de nossa tentativa
de se aproximar de um filme importante por vários lados, para marcar sua passagem
pelos nossos cinemas para muito além do número de espectadores que ele por acaso
faça num circuito comercial um tanto viciado. Essa, afinal, é uma das maneiras
que um filme “existe”, para além dele mesmo. Esta semana
também temos uma estréia bastante importante, há muito aguardada por nós mesmos:
nossa redatora Renata Gomes, que já vinha escrevendo textos sobre os filmes em
cartaz, mergulha agora no imenso campo dos games, universo que vem estudando
com muita atenção – atenção aliás ainda bem pouco dedicada a este que é, cada
vez mais, um dos mais influentes regimes de produção audiovisual. Esperamos que
Renata, nos intervalos do seu trabalho no doutorado sobre o tema, consiga fazer
com que a Cinética participe ativamente do pensamento formulado sobre esta área
no geral ainda muito desconhecida. Vale ainda esclarecer
um assunto sobre o qual os leitores NÃO lerão nada na Cinética: o Festival de
Gramado. Longe de um haver desinteresse nosso sobre o tema – que até se justificaria
alguns anos atrás quando Gramado tinha virado o “festival onde os longas brasileiros
vão para morrer”, mas que neste ano consolida o caminho escolhido a partir do
ano passado (onde basta dizer que Serras da Desordem foi exibido e premiado)
e exibe filmes de Eduardo Coutinho, Paulo Caldas, Hermano Penna e a volta de Carlos
Prates, entre outros. Mas é Gramado que ainda tem desinteresse em ser coberto
por qualquer meio que não tenha a exposição da grande mídia: ao nosso pedido de
credenciamento, a resposta foi de que não só não dariam passagem (algo esperado,
e que nem exigíamos), como também não poderiam dar hospedagem nem ingressos para
a sessão oficial dos filmes – ou seja, podíamos ser credenciados para ver as reprises
na manhã e começo de tarde. Dada a “generosidade” da oferta, tivemos que recusar
a possibilidade de cobrir o Festival. Não se trata aqui,
bem entendido, de questionar critérios de escolha de um festival que é famoso
pela enxurrada de globais na serra gaúcha, independente de estarem sem filmes
sendo exibidos e de nem serem tão globais assim (digamos que o Repórter Vesgo
não reconheceria a maioria deles). A questão é mais de chamar a atenção para o
fato de que a tal “mudança de rumo” se revela, em detalhes como este, como mais
uma maquiagem para ganhar espaço nos cadernos culturais da grande mídia (afinal
houve duas ou três edições tão desinteressantes que o Festival começou a sumir
da mesma, descobrindo assim que curiosamente um festival de cinema não existia
sem filmes) do que realmente uma profissão de fé na importância de um “outro cinema”.
Aos curadores do festival, aos realizadores de filmes em exibição e, acima de
tudo, aos nossos leitores, nossas desculpas então por não respondermos agora a
estes filmes. Possíveis protestos devem ser encaminhados ao Festival de Gramado
– afinal a nossa ausência certamente não causa sozinha lá muita comoção.
Leia
também nossos editoriais anteriores.
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