Herbert De Perto, de Roberto Berliner e Pedro Bronz
(Brasil, 2009)
por Francis Vogner dos Reis

Profissionalismo demonstrativo

Como documentário biográfico, Herbert De Perto acredita na sucessão de fatos como verdade primordial: a relação de detalhes como coisa que justifica e dá sentido à trajetória. É um documentário que não mostras as coisas, que não dá a ver. Ele demonstra. Demonstra como o Herbert Viana é hoje, como ele era antes, como as coisas aconteceram, como se desdobraram e em alguns momentos, como se resolveram. É, no mau sentido, um documentário profissional. Montagem ágil (não exatamente boa), pois ela acredita em dinamismo e rapidez (na funcionalidade), não em ritmo (que dá forma, sentido, e no limite, musicalidade). É também a trajetória do herói com queda e redenção.

Mas, apesar dessa aparente frieza profissional, não é possível dizer que Herbert de Perto não tenha escolhas que visam um conceito muito claro e que venham confirmar seu mecanismo demonstrativo. Se, em uma primeira olhada, o filme parece nos dar mais informações visuais do que imagens reveladoras, há pelo menos uma escolha que é importante e nos lembra que Roberto Berliner dirigiu A Pessoa é Para o que Nasce e Pindorama. Na sequência em que Herbert faz a barba, sai do banheiro e se desloca pelo quarto e pelo closet, vemos uma câmera que, pela primeira vez no documentário, sublinha sua escolha. Colada a Herbert o tempo todo, esta só o acompanha até o momento em que ele começa a ter algum esforço extra pra se deslocar pelos cômodos. Nesse ponto, fica parada, a fim de sentir a dificuldade do personagem.

Em um filme sem muita preocupação em fazer escolhas de plano e montagem que queiram dizer algo, a câmera (como em muitas cenas dos filmes anteriores de Berliner) é companhia cínica, que faz questão de se posicionar perante seu personagem de modo que fique em evidência distanciada a deficiência desse mesmo personagem. O problema não é mostrar a deficiência em si, mas transformar esse momento num feito estético na busca de “distanciamento” que possa dar conta da realidade tal como ela é (pelo menos a realidade de Herbert). Se tomarmos o conjunto do filme – todas as escolhas e o próprio discurso do documentário – esse é o momento em que Herbert é traído pelo cineasta. A câmera o transforma em um deficiente. Se em certo aspecto Herbert é sim um paraplégico, em outro, usar isso para criar um momento “artístico” é concentrar nesse fato (a deficiência adquirida pelo personagem) sentido derradeiro do personagem. E isso não convém, ainda mais para um documentário que se chama Herbert De Perto.

Julho de 2009

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