Santuário
(Sanctum),
de Alister Gierson (EUA/Austrália, 2011)
por Pedro Butcher
Descida
ao inferno
Aventuras costumam preferir os movimentos para
o alto: naves no espaço, heróis pulando entre arranha-céus, bruxos
montados em vassouras voadoras, criaturas azuis domando cavalos
alados. Não é à toa: o céu é um elemento a ser eternamente conquistado,
e a sensação primeira que o gênero busca é a de vertigem. Uma
rara aventura “para baixo” é O Segredo do Abismo (1989),
espécie de filme-beta situado no fundo do mar no qual James Cameron
exercitou temas e tecnologias que foram aprofundados em seus trabalhos
seguintes. Como O Segredo do Abismo, Santuário é
uma aventura “para baixo” – o que por si só já garante algum interesse
em torno do filme.
Estão ali, evidentes, as obsessões de Cameron
pelas profundezas e pela tecnologia (no caso, o mesmo 3D que ele
abraçou com afinco em Avatar), e a promessa de paisagens
incríveis, à la National Geographic,
se cumpre logo nos primeiros minutos. Mas o filme, que fique bem
claro, não é de Cameron. Apesar de ter abraçado os trabalhos de
promoção a ponto de aparecer mais que o próprio diretor e elenco,
o cineasta assina, aqui, apenas a produção executiva – e sua ausência,
do ponto de vista estético, se faz ver. As duas características
que fizeram de Avatar um êxito – o cuidado extremo com
a tecnologia e a eficiência na busca por extrair sensações físicas
do espectador – marcam presença em Santuário, mas sem a
mesma força. O 3D está longe de ser uma picaretagem, como se tem
visto por aí, mas não chega a deslumbrar.
As
questões do filme são outras, e envolvem decisões do ponto de
vista mais básico, narrativo. Enquanto a história está centrada
na exploração da caverna, Santuário concentra seus maiores
problemas. O primeiro está ainda no roteiro, nada convincente
ao apostar no exagerado conflito dramático entre Frank (Richard
Roxburgh), o explorador durão e experiente, e seu filho Josh (Rhys
Wakefield). O segundo é um pouco mais grave e envolve decisões
da direção. Preparando-se para mergulhos mais fundos e arriscados,
Frank justifica sua paixão pela atividade repetindo o privilégio
de apreciar pela primeira vez paisagens deslumbrantes, onde nenhum
ser humano havia posto os olhos antes. À medida que os exploradores
avançam, no entanto, a câmera se antecipa, e chega lá antes dos
personagens. Se a idéia do recurso era dar ao espectador a impressão
de que ele é ainda mais privilegiado que aqueles personagens ou
antecipar um possível perigo futuro, seu resultado é apenas afrouxar
o drama e reduzir o impacto.
Aos poucos, no entanto, a aventura vai sendo substituída
pelo horror, e a partir de determinado momento a expedição torna-se
uma descida a um inferno aquático. De cenário paradisíaco, a caverna
se transforma em um local de confinamento e morte, ideal para
fazer aflorar as franquezas humanas. É como o oposto da caverna
de Platão: nesta caverna, o simulacro dá lugar às verdades que
afloram com as situações-limite. E o filme, pelo menos aí, melhora
substancialmente, ganhando em tensão e originalidade.
Fevereiro
de 2011
editoria@revistacinetica.com.br |