Stardust - O Mistério da Estrela
(Stardust), de Matthew Vaughn (EUA, 2007) por
Eduardo Valente Fantasia
de filmeNo mundo pós-Senhor dos Anéis e Crônicas
de Nárnia, dá um certo frio na espinha saber que veremos mais um “filme numa
terra de fantasia”, uma vez que os acima citados, entre vários outros, têm parecido
se esmerar a cada momento em tirar toda a fantasia possível do gênero, se escorando
basicamente numa grandiosidade barroca que menos faz sonhar do que deseja causar
efeito pela sua grandiosidade (como produção, como narrativa lendária, etc). Mas,
vendo Stardust percebemos, não apenas pelo uso do material dramático, mas
principalmente por uma série de opções de realização (a mais óbvia sendo a trilha
sonora), que seu diretor Matthew Vaughn parece estar tão entediado por estes outros
filmes quanto vários de nós. E, nesse sentido, seu trabalho dentro do gênero parece
muito mais próximo de um filme de M. Night Shyamalan do que dos acima citados
(embora valha deixar claro que nesta comparação não falamos exatamente de mise-en-scène,
mas sim da forma de trabalhar dentro de um “gênero”). De fato, em mais de um momento
a narrativa nos faz pensar que estamos vendo uma mistura de A Vila com
A Dama na Água. Para
muitos, é fato, bastaria saber que Stardust é baseado num livro de Neil
Gaiman (o responsável por, entre outros, os roteiros dos quadrinhos de Sandman)
para saber que ele estaria longe de ser “apenas mais um filme de fantasia” – afinal
Gaiman é conhecido, acima de tudo, pela sua capacidade de criar mitologias apaixonantes
ao mesmo tempo em que mantém um olhar de fora, quase metalinguístico e sempre
muito irônico sobre as mesmas. E o grande segredo do filme de Vaughn é justamente
este: pela via do humor fino, muitas vezes altamente negro (especialmente no que
se refere aos príncipes e sua luta pelo trono), conseguir nos tornar parceiros
de um universo fantástico que sabe rir de si mesmo (lembramos aqui dos fanáticos
por Tolkien que não conseguem ver graça nas piadas sobre o caso entre Frodo e
Sam ou sobre a aparência, digamos, anódina do mundo dos elfos). Ao contrário do
respeito “sisudo” (digno de ganhador de Oscar) que a trilogia baseada em Tolkien
inspira, sentimos que todos os envolvidos em Stardust divertem-se muito
– os personagens, antes de tudo (onde o constante sorriso discreto do protagonista,
que parece quase sempre estar achando aquilo tudo “muito doido”), mas também os
realizadores (e atores: afinal, o que é a participação de Robert De Niro senão
uma tremenda diversão?). No
entanto, desde a abertura do filme, sob a narração de Ian McKellen (primeira piscada
de olho a Senhor dos Anéis?), fica muito claro que o filme acredita totalmente
naquele mundo que propõe – ao mesmo tempo, porém, em que se assume como uma narrativa
externa a ele, como algo sobre o qual uma instância narrativa detém o poder. Desta
maneira, o rir de si mesmo nunca anula uma aposta total e irreversível na estrutura
do conto de fadas (e aqui, lembramos de novo de Shyamalan e Dama na Água),
e aí é que Stardust se mostra poderoso: pois é da própria auto-ironia que
o filme consegue tirar uma verdade que nos emociona, que faz com que uma declaração
de amor a um rato faça com que lágrimas rolem do nosso rosto, ou que nos choquemos
com o fato de que uma personagem “brilhar de amor” é uma idéia tão genial que,
afinal, como não pensamos nela antes? Ao tornar a magia
algo comum, ao fazer com que bruxas e cruéis aspirantes a rei tenham a capacidade
de serem ridículos, Stardust nos aproxima deles todos, e por consequência
também de seus heróis. Ao humanizá-los, acaba dando o passo certeiro para que
todos nós possamos nos identificar com sua aventura e participar dela. Afinal
alguém realmente acha que aquele baixotezinho levou o anel, enfrentou O Mal e
salvou o universo? Pois em Stardust não se trata nunca de salvar o mundo,
e sim somente de conseguir achar o amor. Now, that's an adventure!! Novembro
de 2007
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