Ventos
da Liberdade (The Wind That Shakes the Barley), de Ken Loach (Inglaterra,
2006) por Cléber Eduardo
Revolução pela caretice Interior
da Irlanda, anos 20. Somos apresentados ao protagonista, um médico de partida
para Londres. Essa partida é logo problematizada pela entrada em cena dos soldados
ingleses, uma cambada de psicopatas sádicos, que já chegam esmurrando todo mundo
e matando um dos irlandeses. Diante de uma segunda cena de espancamento, restará
ao médico, homem da ciência, da razão, dos diagnósticos e da cura, integrar a
reação armada contra os ingleses. Essa reação, organizada sob a sigla do IRA,
é legitimada (pelo filme), mas, conforme as ações radicalizam-se, gera conflitos.
Será legítimo empregar os métodos dos opressores? Uma outra questão é levantada
quando surge a possibilidade de uma solução pacífica não emancipadora: negociar
com os ingleses, nas bases deles, não seria entregar os pontos? Pela ótica de
Loach, sim, ao menos se a operação do filme, conforme vimos, seguir a ótica de
Loach. Porque está muito claro que existe um herói ali e esse herói paga o alto
preço da coerência de suas atitudes (mesmo as mais questionáveis). Pronto,
é disso que trata o filme. Poderia ter tratamento melhor, mais complexo e menos
maniqueísta, mas poderia, acima de tudo, ter sido resolvido com um artigo, uma
dissertação, um romance, não necessariamente por meio do cinema. A tirania pedagógica
de Ken Loach é de gerar bocejos. Se desde o início sabemos a quem odiar e por
quem torcer nesse enfoque embalado como denúncia histórica, é questionável a própria
motivação de se filmar agora esse antagonismo entre dois povos e dois países,
ao menos com um enfoque sem nenhuma novidade em matéria de acontecimentos, sem
nenhuma originalidade na abordagem desse processo de várias décadas. De qualquer
forma, pela maneira pedagógica e redutora com que desenvolve a inimizade em cena
e os conflitos internos dos irlandeses, Loach posa de professor. Mas,
talvez queira menos nos ensinar algo sobre a História e mais sobre qual é o lado
certo dessa pendenga (aquele para o qual devemos torcer). Seu filme é um novelão
político, filmado com grau zero de criatividade e inventividade, um drama sub-hollywoodiano,
empenhado em manter o espectador seguro, certo de que, na soma das imagens, está
reagindo corretamente. O fato de ter dois irmãos, um de cada lado sobre a melhor
maneira de se comportar diante dos ingleses, não é cultivo de complexidade. É
exploração de emoção fácil. A pergunta que não quer calar é: qual o sentido de
se voltar à essa questão histórica hoje? Se o diretor a
toma apenas como analogia para outras lutas entre oprimidos e opressores, em qualquer
época, está menos retratando uma questão específica para assumir uma postura política
e filosófica universal, sem variáveis, que toma partido da reação pela violência
como caminho legítimo dos oprimidos pela força, mesmo se essa reação incorporar
procedimentos bastante complicados de se aceitar, ou pelo menos apesar desses
situações questionáveis. Há de se respeitar esse ponto de vista de Loach, certamente,
mas há de se espantar com a disjunção, na falta de termo melhor, entre a posição
revolucionária e mise-en-scène conservadora e conformista, que faz sem
nenhuma rebeldia estética o jogo da indústria da manipulação de sensações. E não
se está aqui batendo nesse jogo específico, mas sugerindo sua sintonia com o jogo
do cinema hegemônico. editoria@revistacinetica.com.br
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