Afogados em filmes por
Cléber Eduardo, Eduardo Valente e Leonardo Mecchi Não
faz nem seis meses que mencionávamos aqui em nosso editorial um circuito (seja comercial, seja de
mostras) bastante anêmico, que inspirava poucas idéias e pautas na revista. Pois
os últimos meses provaram-se uma inversão do famoso dito, já que de fato os dias
de pouco provaram-se véspera de muito, pelo menos no que tange o eixo Rio-SP (mas
não apenas, já que tivemos o For Rainbow em Fortaleza, o Indie 2008 em BH, o FIC
em Brasília, e agora a abertura da Janela Internacional de Cinema no Recife).
A partir da mostra em homenagem a Robert Altman, os últimos três meses foram de
uma imersão quase absoluta nas salas escuras. Tivemos a homenagem a Alain Resnais
e a Jornada do Cinema Silencioso (dois dos grandes eventos do ano, sem dúvida),
logo depois o ciclo dos tradicionais Festival do Rio e Mostra de SP (que neste
ano ainda se sobrepuseram a mostras raras e de interesse como a do Oriente Desconhecido
e da Nouvelle Vague Indiana) e, sem descanso, a retrospectiva completa do alemão
F. W. Murnau e o Curta Cinema (no Rio), além de um complemento da Indie e o Mix
Brasil (em São Paulo). Parece (e é) um panorama luxuoso do
cinema internacional e nacional, contemporâneo e histórico, de nomes consagrados
ou a descobrir. No entanto, esta sobreposição de eventos em tão curto espaço de
tempo também se configura num desafio impossível de reter – seja pelo cinéfilo
mais aplicado, seja por uma revista como a Cinética (embora não nos impeça de
tentar, algo que continuaremos fazendo nas próximas semanas, ao darmos conta das
impressões sobre a mostra de Murnau ou da Nouvelle Vague Indiana). Se faz algum
sentido que o Festival do Rio e a Mostra de SP aconteçam com um intervalo pequeno
entre eles (porque acabam partilhando cópias de filmes e às vezes convidados internacionais),
é menos simples compreender porque uma instituição como o Centro Cultural Banco
do Brasil, que surge neste ano com um evidente fôlego novo no desejo de propor
mostras de real importância no panorama cinematográfico onde atua, não pode fazer
um planejamento de agenda mais cuidadoso que tente evitar que algumas destas sobreposições
aconteçam, com evidente prejuízo para os cinéfilos (que não podem dar conta dos
eventos simultâneos), e principalmente dos filmes raros que não podem ser de todo
usufruídos. Da mesma maneira, o Indie parece conformado em se colocar num papel
regional de força em BH, pois sua perna em São Paulo acaba sempre bastante esvaziada
por aparecer no vácuo da Mostra, encontrando os cinéfilos sem fôlego e sem dinheiro
depois da maratona anterior. Com uma simples mexida de datas, talvez o evento
pudesse ganhar bastante força no cenário nacional. Para além
do calendário, é importante também notar os verdadeiros elefantes brancos em que
vêm se transformando o Festival do Rio e a Mostra de SP, que a cada ano parecem
exacerbar a opção pelo gigantismo (do que a Première Brasil com quase 40 longas
neste ano foi um exemplo absurdo). Trata-se, lógico, de algo bastante sintomático
de um momento midiático em que os números chamam mais a atenção, mas digamos logo:
um festival com 400 filmes não é necessariamente melhor do que um com 100 ou 150.
Há alguns anos, e cada vez mais, ambos os eventos vêm claramente abrindo mão da
noção de curadoria ou seleção, propondo uma indigesta bagunça de filmes que não
passa apenas pelo positivo valor que é a diversidade, mas sim pela completa falta
de critérios. Nesse movimento, alhos e bugalhos misturam-se e parecem equivaler-se
o tempo inteiro. Até por isso, aqui na revista o momento é de balanço: afinal,
se por um lado consideramos que os quase 150 textos que publicamos sobre filmes
entre a cobertura do Festival do Rio e a da Mostra de SP são uma aproximação razoável
com o que de mais importante foi visto por aqui, ainda assim é preciso dar um
mínimo de tempo e visão de conjunto para se poder, minimamente, tentar ver o que
sai de realmente relevante deste mergulho um tanto assoberbado. Afinal, acreditamos
sempre que a mágica do nosso fascínio pelo audiovisual não se dá somente pela
hiperexposição, mas sim pela valorização daqueles um ou dois momentos únicos verdadeiramente
potentes. *** Para mantermos a transparência
com nosso leitor, cabe informar que, pelo terceiro ano consecutivo, nossa solicitação
de credenciamento para o Festival de Brasília foi negada pela organização do evento.
Se nos últimos dois anos Cléber Eduardo esteve lá, enviado pela Mostra de Tiradentes
e para participar de um debate, como neste ano não tivemos este caminho paralelo,
não haverá uma cobertura do festival pela revista. Leia
também nossos editoriais anteriores.
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